O oleiro
Salvador tinha como profissão fazer belos vasos, era o oleiro mais famoso de sua cidade por fazê-los de todos os tipos. O mais interessante em seus vasos é que um não era igual ao outro. Com suas mãos hábeis, Salvador tinha um cuidado imenso ao escolher o barro e como seria em cada detalhe sua mais nova obra.
Enquanto dava forma em sua escultura, o oleiro cantava para passar o tempo, pois era um trabalho longo e detalhado. O barro nas mãos de Salvador ficava pensando em que tipo de vaso se tornaria. No íntimo, vários deles gostariam mesmo e ser o mais belo vaso para enfeitar alguma sala do grande palácio do rei.
Era imprevisível a forma que salvador daria aos vasos, uns eram para uso nobre, outros para uso comum, talvez.
Havia sempre a reclamação de algum vaso, que não gostava do formato que tinha recebido. Muitos dos vasos temiam a última etapa de fabricação, a fornalha:
- Mas – dizia o oleiro – sem passar pelo fogo é impossível vocês serem realmente vasos completos e aprovados.
Como era muito bom, Salvador sempre os encorajava a passar pela fornalha, dizendo que do outro lado sairiam para uma finalidade nobre e que, sem a passagem, seriam apenas vasos fracos sujeitos a se quebrarem e se tornarem pó novamente. Para a tristeza de Salvador, muitos de seus vasos escolhiam viver sem a passagem pela fornalha e depois ele via como os vasos se saiam em SUS caminhadas. Muitos caiam, se machucavam e alguns até ficavam irreconhecíveis.
Salvador lamentava ao ver sua bela obra, feita com tanto carinho, ficar naquele estado. Sempre tinha algum vaso que depois de resolver viver distante voltava arranhado, lascado e até mesmo sem a forma original. Mesmo assim, Salvador ficava muito feliz em vê-lo de volta. Com um pouco de trabalho o vaso era refeito, uns iam para a fornalha e outros, infelizmente, mesmo com tanto sofrimento, depois de remendados voltavam para o mesmo caminho.
A etapa mais difícil sempre era escolher passar ou não pelo fogo. Os que já haviam passado, agora desfilavam com toda a sua beleza e percebiam como eram fracos antigamente e nada se comparava à nobreza de hoje.
Os que ainda estavam em etapas anteriores sempre procuravam os vasos nobres, aqueles passados pela fornalha, para saber mais sobre o calor do caminho.
Mas havia um segredo de quem se tornava vaso nobre e somente passando para o outro lado se poderia saber o que era.
Depois de muito pensar, Vasinho, como era chamado por todos, pois era um tanto quanto pequeno, magro e fraco, foi até Salvador contar sua decisão de passar pela fornalha. Salvador, muito contente, disse ao Vasinho que quando ele chegasse do outro lado certamente seria um precioso vaso.
Com o passar do tempo, Vasinho, já quente pelo calor do fogo, percebia mudanças em seu formato, apesar da dor. E conforme sentia a mudança, enchia seu interior com algo maravilhoso que o deixava cada vez mais forte. Tinha a impressão de estar sendo conduzido a um lugar ermo, em areias distantes, de difícil passagem.
Pensava até que em alguns pontos iria fraquejar e cair em cacos. Mas sempre tinha em mente as palavras de promessa do oleiro, que depois deste caminho iria adornar o palácio do grande rei. Ao fim da longa fornalha, Vasinho viu uma grande festa preparada para ele e a voz do amado rei dizendo:
-Este é o segredo de quem passa pelo fogo, e você, Vasinho, com a sua coragem e obediência, esperando em minhas palavras, irá adornar o meu palácio e eu serei o rei a quem você vai servir por toda a eternidade. Durante sua caminhada Vasinho recebeu um grande tesouro, a vida eterna.
Autora: Bárbara da Silveira Franco
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